sexta-feira, 25 de maio de 2012

Ao acordar.

Queria carregar comigo
batom vermelho pra deixar em todas as suas paredes
marcas da minha boca e palavras em vários idiomas
antes de sair assim, sem deixar pista.

Se pudesse, calaria o motor do carro,
sairia sem ruído antes que o sol se ponha,
não há flor em lugar nenhum
que possa roubar e pôr num vaso
pra que veja quando acordar
ao lado de uma garrafa de café quente
que te espere.

Ao invés disso,
estava eu, assim como estou,
sem batons nos bolsos,
cara amarrotada,
um carro barulhento,
sem saber fazer um bom café,
ainda assim, de coração apertado,
saltando a cada vez que no caminho
me deparava com um retorno.

Mas calma, está tudo bem,
Eu vou voltar,
prometo que vou voltar
pra limpar as lágrimas de tinta que deixei pingando no seu chão
e sem lamentação alguma
poder dar-me o tempo que quiser
pra dormir tranquila
e te oferecer um copo d'água ao acordar.

domingo, 20 de maio de 2012

Desajuste.

Manhã de domingo,
e estou longe.
Não sei se poderia estar perto,
mesmo se de fato estivesse,
tudo parece tão pequeno
quanto pareceria sendo visto
há quilômetros de distância.
De uma semana 
atropelada como são todas as semanas,
manhãs de domingo eram a hora
de me pôr no meu lugar.
Me espreguiçar
pra que a mente se encaixe melhor no corpo,
saber que ao meio-dia, a magia terá acabado,
mas a manhã de domingo
esteve ali.
E sim, é manhã de domingo,
mas a manhã de domingo está longe. 
E olhando uma paisagem estranha, 
numa cama que não é minha
e talvez alguém conhecido
circulando nessa casa 
que parece virada para o lado errado,
(mas não tenho certeza se conheço ou não)
escrevo sobre o desajuste
e ouço motores de F1 na TV.

quarta-feira, 16 de maio de 2012

Eu sei, parece difícil,
às vezes as lágrimas vertem
sem que eu possa controlá-las.
Tudo isso vem em golpes,
repetidos, incessantes
e de repente,
vejo meu sangue na lona
ida a nocaute
contra mim mesma.
Não, não é culpa sua,
apenas nunca briguei assim comigo antes,
sempre convivi muito bem
com todos os meus defeitos.
Agora, a ânsia é por me superar,
fazer de mim alguém melhor,
ver que de parte de mim
brota um sorriso seu rosto
e me faz ter vontade de gargalhar.
Eu sei, parece difícil,
com o tempo me acostumo,
mas tenha só mais um pouquinho de paciência,
devo chorar por mais algumas vezes.
Só mais algumas.

terça-feira, 8 de maio de 2012

Nudez.

Amantes da nudez,
detestam roupas e livram-se delas assim que possível.
No limiar do ritual com a brincadeira,
todo aquele pano vai ao chão,
ou se pendura pelos móveis.
Peles diferentes,
o branco e o moreno na mais perfeita sintonia,
o arrepio simultâneo,
pêlos que se eriçam,
marcas, vergões, hematomas,
registro de dentes pelas pernas,
braços, pescoço, coxas,
rastro de água,
pele do rosto encharcada,
olhos abertos, rendidos,
bocas que não se calam,
corpos distantes,
palavras que se entrelaçam no ar,
máscaras que se penduram,
ao lado de cuecas
um sutiã na mesa ao lado.
Amantes da nudez
e amantes nus.
Quando não há mais o que ser tirado,
aí sim
peles grudadas,
suor, gozo,
arrepio,
tudo brilha,
tudo passa a fazer sentido.

quarta-feira, 2 de maio de 2012

O homem.

Estranho homem
que passa com um sorriso enorme no rosto.
De longe avisto a intenção de dizer algo,
proferir palavras a ilustres desconhecidos
que com ele cruzem caminho
num fim de tarde
em meio às árvores. 
A aproximação é inevitável,
há quilômetros já imagino o que diria,
talvez pedisse um abraço,
talvez falasse do céu,
ou apenas nos olhasse 
e se mantivesse sorrindo.
O encontro se dá,
"bom feriado", ele diz,
ainda todos os dentes à mostra,
numa alegria tão genuína
que quase chegava a dar medo.
Sequer temos tempo de responder,
seguimos aos risos da situação,
uma última olhada pra trás, 
parece que ele não olhou e seguiu
dando seus "bom feriado" a outros passantes.
Desacostumados à simpatia,
continuamos conversando sobre como seres humanos parecem ser felizes
sem de fato o serem.
Pensando agora, talvez aquele homem fosse feliz.
Ou talvez fosse tão triste e filho da puta como todo mundo,
e só tivesse sorrido 
ao nos ver vindo em sua direção
no fim de tarde de segunda,
parecendo assim
tão estranhamente
e humanamente
felizes.